Por Davi Pascale
Despertando da Escuridão
Depois de passar por uma série de
turbulências, o Angra firma uma nova formação e lança esse que é seu melhor
trabalho desde Temple of Shadows.
Contando com apenas Rafael Bittencourt da formação original, o grupo renasce
das cinzas e inicia o terceiro capítulo de uma história que teve mais conquistas
do que derrotas.
O Angra foi uma banda que já nasceu
grande. Assim que lançaram seu debut, (o ótimo) Angel´s Cry, começaram a dar o que falar. Existia uma grande
expectativa para saber o que estava aprontando a nova banda do Andre Matos. O
heavy metal surgiu no Brasil nos anos 80 (sim, chegou com atraso por aqui) e na
primeira leva de grupos era comum termos grandes instrumentistas, porém com vocalistas
fracos e inglês macarrônico. Eram poucos os cantores que realmente faziam um
grande trabalho. E André era um deles.
Fora o fato de ter uma extensão
vocal maior do que os demais de sua geração, Andre tinha mais um ponto a seu
favor. O músico optou por sair do Viper, logo após terem lançado (o ótimo) Theatre of Fate, alegando que queria
aprofundar seus estudos no campo da música e acabou se formando em composição e
regência. E foi com essa bagagem que ele chegou ao Angra. Como alguém que já
havia gravado álbuns de destaque, alguém que já tinha prestígio e, agora, alguém
com formação acadêmica.
Essa primeira geração ficou
marcada por lançar grandes músicos no cenário (Rafael, Kiko, Luis e Ricardo se
tornaram referência rapidamente) e por lançar dois trabalhos que hoje são
considerados clássicos do gênero: Holy
Land e o já citado Angel´s Cry.
Essa primeira formação implodiu por possuírem visões empresariais distintas.
Andre Matos, Luis Mariutti e Ricardo Confessori fundaram o Shaman. Rafel
Bittencourt e Kiko Loureiro criaram a segunda encarnação do Angra efetivando
Felipe Andreoli e Aquiles Priester (que haviam gravado um álbum ao lado do
ex-Iron Maiden, Paul Di´Anno) para a cozinha. Para assumir o lugar de Andre
veio Edu Falaschi, que na época se destacava com a banda Symbols. Uma das
principais apostas daquela nova geração.
Edu teve que segurar a bronca. A
cobrança era alta e o papel a desempenhar não era fácil. Andre Matos se
consagrava como o melhor cantor de heavy metal do país. As músicas eram muito
altas e embora seja também um excelente cantor, a região natural do Edu era
mais baixa. Começou uma discussão entre os fãs, que dura até os dias de hoje,
se a escolha havia sido correta. Independente de discussão, Edu conseguiu criar
sua leva de seguidores e gravou dois grandes álbuns ao lado dos garotos: Rebirth e Temple of Shadows.
Da lá para cá, muito pedra rolou.
Confessori voltou para gravar o Aqua,
Fabio Lione assumiu os vocais e Kiko Loureiro foi efetivado no Megadeth. Agora,
os músicos querem emplacar a terceira geração do Angra. Marcelo Barbosa
(ex-companheiro de Edu no Almah) assume as guitarras de Kiko. Bruno Valverde e
o ex-Rhapsody Fabio Lione, firmam sua posição de baterista e vocalista da
banda. E é nesse cenário que chega o álbum Omni.
Contando com a produção do sueco
Jens Bogren (Symphony X, James La Brie, Sepultura), a banda conta com uma
sonoridade mais sombria, mais pesada, porém extremamente bem definida. Trata-se
de um álbum conceitual. A história é uma ficção. A ideia geral é que em 2046 as
pessoas do presente e do futuro irão se corresponder umas com as outras, por
conta da percepção cognitiva alterada por uma inteligência artificial. Interessante...
É comum os trabalhos do Angra
iniciarem com alguma introdução preparando o território para o que viria a ser
a primeira faixa de fato. Aqui, fazem diferente. O CD já abre de cara com
“Light Of Transcendence”. Faixa power metal típica que traz um refrão pegajoso,
no melhor sentido da expressão. Uma espécie de “Nova Era Pt 2”. O alto nível segue em “Travelers of Time”, música que inicia trazendo a velha mistura de ritmos
brasileiros com metal, antes de entrar em uma pegada mais progressiva. O refrão
remete bastante ao Angra fase Andre Matos.
E eis que chegamos na polêmica
“Black Widow´s Web”. A nova faixa de trabalho vem causando polêmica por conta da
inusitada participação da cantora Sandy (sim, essa mesma que você está
pensando). Os músicos decidiram que queriam 2 vozes femininas. Uma angelical,
outra mais agressiva. Convidaram Alissa White-Gluz (The Agonist, Ach Enemy)
para os vocais guturais e a filha do Xororó para a voz mais angelical. Embora
não goste do trabalho da Sandy, acho muito chororô. A faixa não tem nada de
comercial. Pelo contrário, é bem pesada. E a participação dela não dura mais do
que alguns segundos. Boa música com destaque para o excelente solo de guitarra.
E, não, a menina não comprometeu.
“Insania” retorna trazendo
novamente a pegada power metal do início do disco. Mais uma vez contando com um
forte refrão, a canção se destaca pela linha de baixo de Felipe Andreoli. “The
Bottom Of My Soul” é uma balada sombria. Conta com bonitas orquestrações e um
ótimo trabalho vocal de Rafael Bittencourt. Pouca gente comenta sobre ele
cantando, mas sempre curti seu trabalho vocal. Já cheguei, inclusive, a ouvir
uma versão de “Don´t Stop Believin´” (clássico do Journey) com ele quebrando
tudo nos vocais. Espero que isso seja lançado algum dia... “Warn Horns” mostra
que Fabio Lione está mais à vontade na banda. Ele que havia feito um trabalho
bem sutil em Secret Garden, resolveu botar as asinhas de fora
no novo disco. Também vale destacar o criativo solo de Kiko Loureiro.
Embora não seja uma
obrigatoriedade, o fato de misturar elementos de ritmos brasileiros dentro do
power metal progressivo realizado pelo Angra, algo que fazem desde “Never
Understand”, se tornou uma marca registrada do grupo. E a brincadeira volta a
aparecer com força em “Caveman”, onde, inclusive, misturam inglês e português.
“Magic Mirror” é um dos grandes
destaques do novo álbum. Contando com um refrão forte e uma boa linha de baixo
de Andreoli, a música se destaca por sua passagem progressiva. Bruno Valverde
também faz um belo trabalho. “Always More” é mais uma balada. Dessa vez, com arranjo mais
suave e trazendo Lione nos vocais. Achei a composição mais fraca e, de certa
forma, deslocada do restante do material. “Silence Inside” traz uma forte veia
progressiva novamente, com Rafael e Fabio dividindo os vocais e atinge um bom
resultado. “Infinite Nothing” encerra o álbum em grande estilo contando como
uma sonoridade mais cinematográfica.
A escolha de Marcelo Barbosa e
Bruno Valverde foram acertadas. Os dois desempenharam muito bem suas funções e mantiveram as características que seus fãs esperam.
Fabio Lione é, sem dúvidas, um grande cantor e um dos destaques da cena power
metal. Contudo, tenho certeza que parte dos fãs continuarão reclamando da
escolha do substituto. Embora tenha uma ótima técnica vocal e um timbre de voz
que casa com a sonoridade explorada pela banda, o cantor não tem domínio da
técnica de falsete, o que dificulta para cantar o repertório da primeira fase.
Algo que ficou perceptível na recente apresentação que assisti do conjunto.
De todo modo, Omni é o início de uma nova fase e deve
agradar aos fãs. Continuam apostando nos elementos do rock progressivo, nas
orquestrações, na sonoridade speed/power metal. As letras continuam bem
elaboradas. E as composições são muito boas. Um retorno à sua boa forma depois
de três trabalhos que foram apenas regulares. Muito bacana ver o grupo retornando com tudo e calando a boca dos pessimistas que torciam contra. Bem-vindos de volta ao topo!
Nota: 8,0 / 10,0
Faixas:
01) Light
Of Transcendence
02) Travelers
of Time
03) Black
Widow´s Web
04) Insania
05) The
Bottom of My Soul
06) War
Horns
07) Caveman
08) Magic
Mirror
09) Always
More
10) Omni:
Silence Inside
11) Omni:
Infinite Nothing
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