terça-feira, 14 de outubro de 2014

O que é se vender, afinal?





Por Davi Pascale

Recentemente o Rafael criou um post para comentar sobre os fãs do Eluveitie que estavam acusando a banda de terem se vendido, por terem realizado um comercial para a Honda. Esse é um assunto que já me deparei trocentas vezes no decorrer da vida. Seja ouvindo mimimis de fãs mimizentos ao conversar sobre música com alguém, seja lendo artigos escritos por críticos que tomam Toddynho e arrotam cerveja Kaiser, seja entrevistando músicos nacionais e internacionais. Mas afinal, o que é se vender?

Se vender nada mais é do que você fazer algo que você sempre se posicionou contra porque aquilo te trará mais dinheiro. Se é algo que você nunca se posicionou contra, ou não fere seus princípios, então você não se está se vendendo. A mesma coisa em relação à música. “Ah... o cara mudou o som dele, vendido”. Extremamente discutível. Ele mudou para que? Para uma sonoridade que está tão fora da mídia quanto? Então ele não se vendeu porque a chance de tomar na cabeça é grande. O cara cantava black metal e está cantando Luan Santana? Sem duvida, é um vendido, visto que o tal sertanejo universitário está na moda e são universos opostos.

Infelizmente, muitas dessas críticas dos fãs nascem, tenho que admitir isso, por influencia de críticos que trabalham em veículos especializados. 90% dessas publicações tendem a enaltecer alguns gêneros e acabar com outros. Só que essa história de acabar com um gênero é um desserviço à música. Por que? Porque na tentativa de pagar de mauzão, de polêmico, de dono da verdade (como se isso existisse), criam-se essas brigas estúpidas e intermináveis que jogam contra a música e, por conseqüência, contra o rock n´ roll. Em que sentido? No sentido de que a força de um movimento, seja ele qual for, está na união. E essa atitude cria separações dentro do próprio movimento. Ou seja, algo inútil.

Banda foi tachada de vendida porque parou de gravar fitas cassetes

E o mais engraçado de tudo são os motivos apresentados. Lembro quando entrevistei o grupo Dead Fish, no lançamento de Um Homem Só e o cantor Rodrigo comentou que nem dava mais bola para esse lance de vendido porque ouvia isso desde sempre. Quando questionei ‘como assim’, o cara me respondeu: “A primeira vez que fomos tachados de vendidos foi quando paramos de gravar nossas demos em K7 e começamos à gravá-las em CD”. E aí? Isso é ser vendido?

Esse lance de comercial de televisão e merchandising é bacana. Ajuda a fortalecer a imagem do artista. É claro que tem que haver certos cuidados. Não dá para fazer que nem o Roberto Carlos. Se declarar vegetariano e ir vender carne da Friboi. Aí é sacanagem, mas se for para explorar algo que esteja relacionado à sua imagem, não vejo problemas. Inclusive, é bem comum fora do Brasil.

“Ah... Então não existem artistas vendidos”. Certeza que sim, mas não na proporção em que acusam. Um exemplo clássico é o João Gordo. Ele mesmo já declarou em entrevistas: “me vendi, foda-se”. Enquanto cantor, diria que não. Ratos de Porão sempre continuou com a porradaria de sempre e com letras ferozes. Enquanto figura publica, sim. O cara que cantava “Igreja Universal” ir trabalhar com Marcos Mion na Rede Record sempre será algo questionável. Para quem não está por dentro. O dono da emissora é o bispo Edir Macedo, fundador da tal Igreja Universal. Lembram-se sobre o que disse de ir contra seus princípios? Pois é...

Comercial de TV com rockstars é comum

Agora uma coisa é fato: a galera precisa parar de levar atitudes de artistas tão a serio. Mesmo questionando algumas atitudes do João Gordo, por exemplo (assim como também questiono atitudes de outros artistas), não deixei de respeitá-lo. O que o cara fez com o Ratos foi forte. Embora ele não seja o cantor original, eu sei, foi com ele que o grupo decolou. Quanto suas participações na TV, tem coisas que acho bacana, coisas que acho totalmente equivocadas. Por exemplo, sempre apareceu na TV como um cara desbocado, polêmico, irreverente. O que um cara desses foi fazer trabalhando de jurado no Idolos Kids? Nada contra o programa, mas não tem nada a ver com ele. Seria a mesma coisa que colocar o Zé do Caixão para apresentar TV Globinho. Ou o Luciano Huck para apresentar Cine Trash.

É claro que ver um artista que você admira se vender, é chato. Afinal, um cantor não vende apenas uma canção, vende uma ideologia e a gente se identifica com aquilo. Entendo isso. O problema é que enquanto vocês estão se descabelando, os caras estão curtindo a grana deles e rindo da sua cara. Então deixo duas reflexões aqui: 1) Será que o cara se vendeu ou minha visão é muito fechada? 2) Se o cara se vendeu, até onde afetará minha vida? Reflita!