quarta-feira, 18 de julho de 2018

Angra – Omni (2018):




Por Davi Pascale

Despertando da Escuridão

Depois de passar por uma série de turbulências, o Angra firma uma nova formação e lança esse que é seu melhor trabalho desde Temple of Shadows. Contando com apenas Rafael Bittencourt da formação original, o grupo renasce das cinzas e inicia o terceiro capítulo de uma história que teve mais conquistas do que derrotas.

O Angra foi uma banda que já nasceu grande. Assim que lançaram seu debut, (o ótimo) Angel´s Cry, começaram a dar o que falar. Existia uma grande expectativa para saber o que estava aprontando a nova banda do Andre Matos. O heavy metal surgiu no Brasil nos anos 80 (sim, chegou com atraso por aqui) e na primeira leva de grupos era comum termos grandes instrumentistas, porém com vocalistas fracos e inglês macarrônico. Eram poucos os cantores que realmente faziam um grande trabalho. E André era um deles.

Fora o fato de ter uma extensão vocal maior do que os demais de sua geração, Andre tinha mais um ponto a seu favor. O músico optou por sair do Viper, logo após terem lançado (o ótimo) Theatre of Fate, alegando que queria aprofundar seus estudos no campo da música e acabou se formando em composição e regência. E foi com essa bagagem que ele chegou ao Angra. Como alguém que já havia gravado álbuns de destaque, alguém que já tinha prestígio e, agora, alguém com formação acadêmica.

Essa primeira geração ficou marcada por lançar grandes músicos no cenário (Rafael, Kiko, Luis e Ricardo se tornaram referência rapidamente) e por lançar dois trabalhos que hoje são considerados clássicos do gênero: Holy Land e o já citado Angel´s Cry. Essa primeira formação implodiu por possuírem visões empresariais distintas. Andre Matos, Luis Mariutti e Ricardo Confessori fundaram o Shaman. Rafel Bittencourt e Kiko Loureiro criaram a segunda encarnação do Angra efetivando Felipe Andreoli e Aquiles Priester (que haviam gravado um álbum ao lado do ex-Iron Maiden, Paul Di´Anno) para a cozinha. Para assumir o lugar de Andre veio Edu Falaschi, que na época se destacava com a banda Symbols. Uma das principais apostas daquela nova geração.

Edu teve que segurar a bronca. A cobrança era alta e o papel a desempenhar não era fácil. Andre Matos se consagrava como o melhor cantor de heavy metal do país. As músicas eram muito altas e embora seja também um excelente cantor, a região natural do Edu era mais baixa. Começou uma discussão entre os fãs, que dura até os dias de hoje, se a escolha havia sido correta. Independente de discussão, Edu conseguiu criar sua leva de seguidores e gravou dois grandes álbuns ao lado dos garotos: Rebirth e Temple of Shadows.



Da lá para cá, muito pedra rolou. Confessori voltou para gravar o Aqua, Fabio Lione assumiu os vocais e Kiko Loureiro foi efetivado no Megadeth. Agora, os músicos querem emplacar a terceira geração do Angra. Marcelo Barbosa (ex-companheiro de Edu no Almah) assume as guitarras de Kiko. Bruno Valverde e o ex-Rhapsody Fabio Lione, firmam sua posição de baterista e vocalista da banda. E é nesse cenário que chega o álbum Omni.

Contando com a produção do sueco Jens Bogren (Symphony X, James La Brie, Sepultura), a banda conta com uma sonoridade mais sombria, mais pesada, porém extremamente bem definida. Trata-se de um álbum conceitual. A história é uma ficção. A ideia geral é que em 2046 as pessoas do presente e do futuro irão se corresponder umas com as outras, por conta da percepção cognitiva alterada por uma inteligência artificial. Interessante...

É comum os trabalhos do Angra iniciarem com alguma introdução preparando o território para o que viria a ser a primeira faixa de fato. Aqui, fazem diferente. O CD já abre de cara com “Light Of Transcendence”. Faixa power metal típica que traz um refrão pegajoso, no melhor sentido da expressão. Uma espécie de “Nova Era Pt 2”. O alto nível segue em “Travelers of Time”, música que inicia trazendo a velha mistura de ritmos brasileiros com metal, antes de entrar em uma pegada mais progressiva. O refrão remete bastante ao Angra fase Andre Matos.

E eis que chegamos na polêmica “Black Widow´s Web”. A nova faixa de trabalho vem causando polêmica por conta da inusitada participação da cantora Sandy (sim, essa mesma que você está pensando). Os músicos decidiram que queriam 2 vozes femininas. Uma angelical, outra mais agressiva. Convidaram Alissa White-Gluz (The Agonist, Ach Enemy) para os vocais guturais e a filha do Xororó para a voz mais angelical. Embora não goste do trabalho da Sandy, acho muito chororô. A faixa não tem nada de comercial. Pelo contrário, é bem pesada. E a participação dela não dura mais do que alguns segundos. Boa música com destaque para o excelente solo de guitarra. E, não, a menina não comprometeu.

“Insania” retorna trazendo novamente a pegada power metal do início do disco. Mais uma vez contando com um forte refrão, a canção se destaca pela linha de baixo de Felipe Andreoli. “The Bottom Of My Soul” é uma balada sombria. Conta com bonitas orquestrações e um ótimo trabalho vocal de Rafael Bittencourt. Pouca gente comenta sobre ele cantando, mas sempre curti seu trabalho vocal. Já cheguei, inclusive, a ouvir uma versão de “Don´t Stop Believin´” (clássico do Journey) com ele quebrando tudo nos vocais. Espero que isso seja lançado algum dia... “Warn Horns” mostra que Fabio Lione está mais à vontade na banda. Ele que havia feito um trabalho bem sutil em Secret Garden, resolveu botar as asinhas de fora no novo disco. Também vale destacar o criativo solo de Kiko Loureiro.



Embora não seja uma obrigatoriedade, o fato de misturar elementos de ritmos brasileiros dentro do power metal progressivo realizado pelo Angra, algo que fazem desde “Never Understand”, se tornou uma marca registrada do grupo. E a brincadeira volta a aparecer com força em “Caveman”, onde, inclusive, misturam inglês e português.

“Magic Mirror” é um dos grandes destaques do novo álbum. Contando com um refrão forte e uma boa linha de baixo de Andreoli, a música se destaca por sua passagem progressiva. Bruno Valverde também faz um belo trabalho. “Always More” é mais uma balada. Dessa vez, com arranjo mais suave e trazendo Lione nos vocais. Achei a composição mais fraca e, de certa forma, deslocada do restante do material. “Silence Inside” traz uma forte veia progressiva novamente, com Rafael e Fabio dividindo os vocais e atinge um bom resultado. “Infinite Nothing” encerra o álbum em grande estilo contando como uma sonoridade mais cinematográfica.

A escolha de Marcelo Barbosa e Bruno Valverde foram acertadas. Os dois desempenharam muito bem suas funções e mantiveram as características que seus fãs esperam. Fabio Lione é, sem dúvidas, um grande cantor e um dos destaques da cena power metal. Contudo, tenho certeza que parte dos fãs continuarão reclamando da escolha do substituto. Embora tenha uma ótima técnica vocal e um timbre de voz que casa com a sonoridade explorada pela banda, o cantor não tem domínio da técnica de falsete, o que dificulta para cantar o repertório da primeira fase. Algo que ficou perceptível na recente apresentação que assisti do conjunto.

De todo modo, Omni é o início de uma nova fase e deve agradar aos fãs. Continuam apostando nos elementos do rock progressivo, nas orquestrações, na sonoridade speed/power metal. As letras continuam bem elaboradas. E as composições são muito boas. Um retorno à sua boa forma depois de três trabalhos que foram apenas regulares. Muito bacana ver o grupo retornando com tudo e calando a boca dos pessimistas que torciam contra. Bem-vindos de volta ao topo!

Nota: 8,0 / 10,0

Faixas:
      01)   Light Of Transcendence
      02)   Travelers of Time
      03)   Black Widow´s Web
      04)   Insania
      05)   The Bottom of My Soul
      06)   War Horns
      07)   Caveman
      08)   Magic Mirror
      09)   Always More
      10)   Omni: Silence Inside
      11)   Omni: Infinite Nothing