Por Davi Pascale
Heavy metal, samplers e batuques
Toda vez que um artista faz algo fora do seu território, um
verdadeiro massacre acontece. Tanto por parte da crítica, quanto por parte dos fãs. Há vezes, realmente, em que o artista pisa no tomate, mas tem vezes
onde a crítica é um tanto injusta. Esse álbum do P.U.S. é um trabalho que considero as críticas um tanto quanto
infundadas, mas antes de falar sobre o álbum, vamos entender um pouquinho o
cenário.
O P.U.S. foi criado em 1987, em Brasília, e apostava
inicialmente em uma sonoridade onde mesclava elementos de hardcore com o death
metal. Hoje, seria considerado um som old school. Na época, era, bem... O som da época! Seu primeiro registro foi um
compacto que atendia pelo nome de Third
World, lançado no ano de 1990. Seu primeiro LP, auto-intitulado, foi
lançado no ano seguinte. Esses dois primeiros registros apontavam exatamente
nessa sonoridade death/hardcore e colocavam o grupo no centro do metal
extremo nacional.
Seu trabalho seguinte, Sin In The Only Salvation, de 1994, trazia algumas mudanças no
som do grupo. Os músicos apostavam em uma sonoridade um pouco mais cadenciada,
trazendo um som mais elaborado que pendia mais para o thrash metal do que para o death metal propriamente
dito. As letras também sofreram algumas modificações. As letras sobre sexo foram deixadas de
lado. Os assuntos continuavam obscuros, mas os temas mudaram. Deixaram assuntos como morte e violência de lado, e passaram a falar sobre
ocultismo, escuridão, além de canções repletas de criticas sociais.
Uma delas escrita ao lado do saudoso Chico Science (sim, o próprio), que também
faz uma participação na faixa, o quase-hit “Comando Vermelho”.
Pouco a pouco, a popularidade crescia. Os músicos começaram
a passar por todas aquelas experiências que uma banda que está em ascensão
passa. Tiveram clip veiculado na MTV, começaram a participar de grandes
festivais (entre eles, o Super Metal
Festival, onde dividiram o palco com Korzus, Krisiun, Kreator, entre
outros), tiveram reportagens em revista, os músicos começaram a conseguir
patrocínios com grandes marcas, etc. O problema é que os caras queriam mais e o
publico de metal, como já sabemos, tende a ser conservador.
Anúncio da Washburn com Syoung na fase do Presets |
Na época de Sin Is The Only Salvation, a banda era formada pelo casal Ronan (voz) e
Syoung (guitarra), além de Selvagem (baixo) e Rodrigo (bateria). Aqui, a banda
já havia sofrido dois baques. A saída do guitarrista Xicone, que participou
apenas do compacto, e a morte do baterista Feijão, com quem haviam gravado o primeiro
long play. O rapaz morreu, na época, vítima de HIV. O próximo trabalho traria
mais mudanças. Tanto na formação, quanto na sonoridade. E as mudanças começam com um inusitado encontro.
Antonio Celso Barbieri é um jornalista e produtor que morava em Londres. Ele era um dos contatos internacionais da MTV Brasil. Foi ele
quem forneceu as imagens do Korzus se apresentando no Marquee Club para que
fossem utilizadas no especial sobre a banda. Pois
bem... Eis que, em 1995, ele recebe um telefonema de Cezar, diretor de
Relações Internacionais da MTV Brasil, pedindo para que desse uma força
para um casal de amigos que estavam indo passar uns dias em Londres.
Tratava-se, justamente, de Ronan e Syoung. O rapaz não sabia nada a respeito da banda, nem dos músicos, mas não tinha como dizer não à cúpula da MTV.
Nessa época, Barbieri estava ouvindo muito rock industrial.
Em especial, uma banda alemã chamada Die Krupps. E a sonoridade começou a fazer a cabeça do casal. Um dos passeios que os três fizeram juntos foi conferir de perto algumas atrações em um clube chamado Slamelight. Uma casa bem underground, frequentada por punks e góticos que se achavam vampiros... A sonoridade? Rock industrial, é claro. Aqui no Brasil, pouco se falava sobre o gênero, mas EUA e Europa já começavam a se render ao fenômeno.
Todo esse cenário foi uma influência direta na construção da nova fase. Rodrigo seguiu na banda. O baixista Selvagem, que havia sofrido um grave acidente e estava fazendo vários shows sentado, pediu as contas e foi substituído pelo baixista Fred. Alexandre Hercovitch e Rui Mendes foram contratados para ajudarem a criar a nova imagem do grupo. Completavam o novo time, o experiente tecladista
Franco Junior (que já havia trabalhado com o Paulo Ricardo no início dos anos
90) e a dupla de percussionistas Black Angels. E assim, formava-se o time de
Presets, o ultimo álbum do P.U.S. que chegaria às lojas em 1996.
Foto promocional da banda |
A banda continuava sendo uma banda de heavy metal, as influências
de hardcore continuaram, as guitarras de Syoung continuavam sendo um destaque com riffs certeiros. O problema é que eles tiraram essa pegada mais
extrema. Abandonaram as influências de death e thrash e trouxeram teclados,
samplers e percussão afro-brasileira. Syoung começou a aparecer um pouco mais como cantora e Ronan mudou totalmente seu estilo. Os vocais guturais sumiram. Eu, particularmente, prefiro ele cantando limpo, mas claro que os fãs da época malharam os caras e os taxaram de vendidos, traidores e tudo mais.
“Presets” inicia o álbum já jogando todas as mudanças na
cara. A percussão costurando o arranjo, as guitarras distorcidas, os
teclados, as vozes mesclando o vocal de Ronan com os vocais de Syang... Essa foi uma das 2 contribuições de Barbieri como letrista. “Seu
Verino” foi o single do álbum com direito a clipe e tudo mais. A música tinha
uma pegada mais comercial e é meio que uma homenagem ao Selvagem. “Unreal”
trazia os músicos entrando de cabeça na sonoridade eletrônica, com Syang
cantando de modo sensual com direito à gemidos e sussurros. Essa trinca inicial
é muito boa e mostrava o grupo no auge da criatividade.
A maior polêmica do álbum vem a seguir. Os músicos regravaram
“Mosh”, uma musica de seu primeiro registro, só que usando essa sonoridade mais moderna. Os fãs ficaram putos, mas a real é que ficou bem interessante. “If”
dá uma derrubada no andamento, mas mantém a qualidade das composições. Em “Via
Adultera”, o nível das composições cai. “I See It All” também não ajuda muito. Ainda
que goste da ideia de ter Ronan e Syang dobrando as vozes, acho a composição
sem sal. São canções que dão a impressão que a intenção foi boa, mas ficou
faltando alguma coisa.
“Desempregado” é mais uma volta ao passado. É uma musica do
Detrito Federal, banda que a Syoung tocava antes de se aventurar como guitarrista do P.U.S. Os backings são
repletos de participações especiais como Digão (Raimundos), Laura Finnochiaro e
até mesmo Kiko Zambianchi. Musica mediana apenas, mas a audição é, no mínimo, curiosa.
“Hopeless Man”, mais uma contribuição de Barbieri, chega diminuindo o andamento mais uma
vez, só que voltando a inspiração lá para cima. “Asma” fecha a parte de composições inéditas e também é bem legalzinha. Acredito que seja a que apresenta sonoridade mais direta dentre as faixas
do álbum. Bem, ela e “Severino”.
Fita K7 promocional com canções que iriam para o album |
No final do disco, temos 3 remixes. 2 da faixa “Unreal”, que
são dispensáveis, e 1 da faixa “Desempregado”, que é muito bom. Honestamente, achei que tem
mais a ver com o clima do álbum e ficou mais instigante do que a versão
escolhida para integrar o tracklist. Arranjo bem mais inspirado. Essa deveria ser a versão oficial, na minha opinião. Outra curiosidade é que esse álbum trazia
um CD-Rom, onde podíamos assistir ao clipe de “Seu Verino”, que fez bastante sucesso
na MTV, na época. A qualidade de imagem era regular, mas a intenção era boa e o clipe, apesar de contar com uma produção bem simples, era divertido.
Claro que o álbum tem alguns deslizes, como mencionados no
texto, mas a verdade é que sua audição é bem interessante. Trata-se de um
trabalho inteligente, diferente, ousado, corajoso, muito bem feito e que mereceria uma atenção maior.
Infelizmente, esse foi o trabalho que acabou com a trajetória da banda. O grupo não aguentou a pressão e encerrou as atividades pouco depois. Realmente, uma pena! Da
galera que tocava na banda, somente a guitarrista Syoung, conseguiu um
momento de destaque na mídia ao trocar seu nome para Syang e apostar em
trabalhos mais populares. No momento, ela vive nos arredores de Los Angeles e dá aula de jiu-jitsu por lá. É galera, esses tempos não voltam mais. Infelizmente...
Aliás, diz a lenda que a música "Seu Verino" foi uma espécie de cutucada no baixista Selvagem. Confesso que se for verdade, foi bem de mau gosto.
ResponderExcluirSerá?! Já tentei achar essa letra para ler com calma, mas não acho em lugar nenhum. Tenho o CD original, mas no encarte não constam as letras...
ResponderExcluirFalando nisso, também tenho o CD e e queria a letra de IF.
ExcluirAlguém, por favor?