Por Davi Pascale
E mais uma polêmica veio à tona.
A imprensa brasileira e boa parte do público viraram as costas para o músico
Lobão. Isso não é nenhuma novidade. Quem acompanha a carreira do rapaz, sabe
que ele nunca foi o queridinho da mídia. O que me levou a escrever esse texto é
o fato que em pouquíssimos dias, três pessoas do meio artístico, sofreram
ataques do público e da mídia, de maneira excessiva, por demonstrarem sua
opinião. Justamente, por ser formado em jornalismo, achei que deveria me
manifestar sobre o assunto. Agora, com um músico de rock no centro dos ataques,
é o momento ideal para deixar minhas impressões por aqui.
Vivemos em uma época onde o
politicamente correto predomina. Só que aquela velha história, qualquer coisa
que seja em excesso não é sadio. Nos livramos da censura. Sim, sofremos com
isso em um passado não muito distante. Inclusive, Lobão. Antes de se lançar
cantor, o rapaz foi baterista de artistas como Blitz e Marina Lima. O álbum que
gravou ao lado de Evandro Mesquita, As
Aventuras da Blitz (um dos LPs responsáveis por abrir caminho para a cena
BRock), foi censurado de maneira vergonhosa. As duas últimas faixas do LP
vinham com arranhões profundos para que a pessoa que comprasse o disco não
ouvisse as faixas. A Blitz era um grupo que fazia um pop irreverente e os
censores acharam que a expressão ‘a puta que o pariu’ era uma afronta. Sinto
dizer, mas estamos indo por esse caminho.
Estamos retrocedendo e já tem um
tempo. Me lembro de uma entrevista com o humorista Renato Aragão, há uns 5 anos
aproximadamente, onde ele comentava a dificuldade de criar novos textos diante
do politicamente correto. Segundo o mesmo, várias piadas que realizou ao lado
dos Trapalhões na década de 80, se fizesse agora sofreria processo. O problema
é que Os Trapalhões faziam um humor inocente e eram assistidos por inúmeras crianças.
Quando Roberto Bolãnos (Chaves) morreu, teve crítico que teve a cara de pau de
escrever que o comediante fazia um humor agressivo explorando bullying. Olha
onde chegamos...
Musico sofreu com censura |
O ataque agora é porque em seu
último show, realizado no Teatro Bradesco, o compositor Lobão, alterou a letra
de sua canção. “Vida Bandida” se tornou “Dilma Bandida”. É claro, os petistas
estão pedindo sua cabeça. Os defensores do governo, que pedem a punição do rapaz, deveriam se recordar que vários de seus ídolos – como Chico Buarque e Caetano
Veloso – sofreram na época dos militares por conta de suas letras. Tudo bem que
a escrita de Chico e Caetano é mais rebuscada, mais poética, mas a situação é a
mesma. Estão sendo consideradas ameaça para o governo, então tiramos do
caminho. Isso, meu amigo, chama-se censura. E é proibido proibir, certo Caetano? Antes de questionarem a integridade
do velho lobo, deveriam olhar para seu próprio umbigo e ver o que seus ídolos
se tornaram. Acho muito mais decepcionante que artistas com esse histórico
defendam censura de biografias do que um cantor mudar de lado político por ter
se decepcionado com o rumo da história.
Para quem diz que Lobão está
agindo assim por querer atenção, recomendo estudar sua biografia. O músico sempre
foi considerado polêmico e não é de hoje que deixa sua posição política nítida.
O rapaz fez campanha política para o Lula décadas atrás, fez música criticando
o presidente Fernando Collor de Mello no disco O Inferno é Fogo. “Presidente Mauricinho” era o nome da canção,
onde chamava o presidente de babaca aos berros. O auê todo, como podem ver, é
porque se no passado defendia a esquerda, agora a critica. Pode-se questionar a
mudança de lado, mas dizer que não tinha esse tipo de atitude no passado é um
pouco nonsense.
Musico já havia atacado um presidente em suas músicas anteriormente |
Mais do que isso, o auê também
ocorre porque nosso amigo roqueiro está indo contra a maré em uma época predominada
pelo politicamente correto, onde o povo parece ter passado por uma lavagem
cerebral. O jornalista Zeca Camargo foi duramente criticado por ter questionado,
em uma crônica, se a cobertura da morte do Cristiano Araujo não havia sido exagerada.
Muitos chegaram ao ponto de dizer que o rapaz deveria ter sido imparcial. Como
assim? Imparcial em uma crônica? Muitos chegaram ao ponto de questionar quem
era Zeca Camargo. Inúmeras pessoas da geração MTV. Não sou um grande fã do
Zeca, mas se você cresceu assistindo MTV e nunca ouviu seu nome há algo de
errado com você. Se tentou se utilizar de ironia também não deu muito certo. O que o cantor tinha de vida, ele tem de carreira. Monica Iozzi (ex-CQC) foi massacrada depois de ter comentado em
uma reportagem sobre o Cazuza que os jovens que não conhecem sua obra, deveriam
deixar o sertanejo um pouco de lado e ouvir suas músicas. Deixou claro: “gosto
de sertanejo, mas não pode ser só isso”. De nada adiantou. “Menos sertanejo
universitário, mais Cazuza” se tornou uma das frases mais comentadas nas redes
sociais, quase sempre em tom de ataque.
Há quem diga que os artistas não
deveriam se manifestar sobre política. Digo o contrário. Principalmente,
dentro do estilo que amamos. O rock sempre foi um estilo contestador, fazia
muito tempo que nossa política não era tão comentada quanto agora. Ao mesmo
tempo, nosso rock nunca esteve tão irrelevante. Crítica política no rock n´
roll é algo que sempre existiu. Explorar seu ponto de vista nas letras, nos shows, pode ser
um modo de trazer de volta um pouco da atitude que se perdeu. A tão cultuada
cena de 80 teve muito desse engajamento. Engenheiros do Hawaii (“E o fascismo é fascinante. Deixa a gente ignorante, fascinada”), RPM (“agora a China bebe
Coca-Cola, aqui na esquina cheiram cola”), Legião Urbana (“nas favelas, no
senado, sujeira pra todo lado”)... Todos foram questionadores. Cada um à seu
modo, é claro. É óbvio que, nesses mais de 30 anos de carreira, Lobão também
cometeu algumas gafes, mas ao menos dá a cara à tapa. Por isso digo; menos
sertanejo universitário, mais Lobão.
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