domingo, 16 de março de 2014

18 Anos Sem Mamonas




Por Davi Pascale

Todos que viveram a explosão do Mamonas Assassinas irão sempre se lembrar do mês de Março como um mês triste. Foi nesse mês que o Brasil perdeu um dos grupos de rock mais divertidos que já existiu na história da música brasileira. Um final trágico para uma banda alegre.

Tudo passou muito rápido, tão rápido que não deu tempo de enjoar, apesar do sucesso intenso. Os cinco garotos de Guarulhos foram o ultimo grande fenômeno do rock brasileiro. Foram capas de tudo quanto é revista, apareceram à exaustão nos programas de TV, as apresentações eram repletas de histeria. Desde o sucesso do RPM em 1985 que não se via um auê tão grande em cima de um artista de rock.

Sim, de rock. O trabalho era tão inteligente que muitos não compreenderam. Nem mesmo os críticos. Uma famosa revista semanal chegou a escrever um artigo descendo a lenha no grupo onde o principal argumento do jornalista era de que eles não tinham estilo, de que eles não sabiam aonde queriam chegar, que no CD tinha de tudo: baião, sertanejo, pagode. Errou feio. Sabiam muito bem onde queriam chegar: Mamonas Assassinas era um grupo de rock cômico que satirizava outros gêneros musicais. Eles flertavam outros segmentos com o rock.

Não satirizavam apenas segmentos, mas satirizavam artistas. Há várias indiretas nos arranjos. A referencia ao Belchior em “Uma Arlinda Mulher”, o instrumental do The Clash em “Chopis Centis”, à sátira ao Raça Negra em “Lá Vem o Alemão”. Não escapava ninguém. Tudo minimamente planejado.

Grupo confundiu cabeça dos jornalistas

As pessoas de mais idade pareciam mesmo terem uma dificuldade em entender um trabalho tão jovem. Até mesmo o diretor da gravadora deixou o trabalho passar batido. Precisou que seu filho, Rafael Ramos (produtor da Deckdisc, até então cantor do Baba Cósmica) acordasse o profissional para a realidade. O material era muito bom para deixar passar em branco. Foi o garoto que alertou que aquilo ali era uma galinha de ovos de ouro, que se ele não pegasse alguém iria. A prova de que é possível fazer um trabalho jovem e inteligente.   

Uma das razões de tudo ter funcionado tão bem é que o humor era natural para eles. Não foi aquela história de ‘vamos fazer umas musicas engraçadinhas porque a onda é essa’. Pelo contrario, Dinho se juntou aos rapazes por conta de uma palhaçada que aprontou no show do Utopia. O publico pedia para tocarem “Sweet Child O´Mine” e quando os músicos dispararam “a gente toca, mas alguém tem que cantar”, lá foi ele. O cara subiu ao palco sem saber a letra e fez um embromation a musica toda, arrancando vários risos da platéia e dos músicos. Os garotos sentiram que havia algo especial ali. E eles estavam certos...

O melhor musico certamente era o guitarrista Bento Hinoto, no entanto, sem o carisma e a irreverência de Dinho, não teriam acontecido. Mesmo não tendo um grande alcance vocal, Alecsander Alves, roubava a cena no palco. Fosse nas piadas que improvisava, nas imitações que lançava do nada ou ainda na sua postura de palco. Não sabia o significado da palavra vergonha. Cantava de saia, chapéu de touro, o que precisasse. 

Mamonas em uma de suas clássica fantasias

Aliás, as vestimentas engraçadinhas tornaram-se uma marca registrada. Ninguém sabia como iriam subir ao palco. Subiram de prisioneiros, Chapolins... Na apresentação que assisti subiram de pijama. O show aconteceu de dia, não tinha uma tirada melhor. Diziam que para a próxima turnê planejavam subir ao palco vestido de Beatles e um deles (provavelmente o Bento) seria a Yoko Ono. Não sei até onde é verdade, mas certamente seria hilário.

Algo que me preocupava era a aproximação deles com o publico infantil. Justamente pelas roupas engraçadas e o jeito irreverente de Dinho, muitas crianças se apaixonaram pelo conjunto. Era engraçado ver uma criança cantando ‘o homem é corno e cruel, mata a baleia que não chifra e é fiel’ sem entender absolutamente nada do que estava dizendo e os pais achando engraçadinho. Se fosse com outro artista, esses mesmos pais chamariam de aberração. Claro que a mídia não deixava por menos e ficava discutindo até onde seria interessante os pais permitirem que seus filhos escutassem o disco do Mamonas Assassinas. Os argumentos eram os mais toscos possíveis. De todo modo, o que me preocupava era a idéia dos músicos quererem manter esse publico e passarem a pegar mais leves nas letras. O legal do Mamonas era o deboche, a irreverência. 

Disco vendeu mais de 1.000.000 de cópias em apenas 6 meses

Essa era umas das principais ‘duvidas’ dos ouvintes. A outra é se seria possível manterem o interesse e as vendas (que passaram rapidamente de 1.000.000 de cópias vendidas) em um segundo álbum. Todos os grupos de rock brasileiro que haviam tido seu momento de beatlemania, haviam fracassado (do lado de vista comercial) em seu projeto seguinte.

Infelizmente, graças à uma tragédia nunca teremos essas respostas. No dia 2 de Março, o jatinho learjet que transportava o grupo de volta à Guarulhos depois de terem apresentado o ultimo show da turnê, chocou-se na Serra da Cantareira. O piloto precisou arremeter o avião e fez para o lado errado. Era o fim da turnê e o fim de um bonito e intenso sonho.